terça-feira, 30 de abril de 2013

Renascimento

Renascimento, Renascença ou Renascentismo são os termos usados para identificar o período da História da Europa aproximadamente entre fins do século XIV e inicio do século XVII. Os estudiosos, contudo, não chegaram a um consenso sobre essa cronologia, havendo variações consideráveis nas datas conforme o autor. Seja como for, o período foi marcado por transformações em muitas áreas da vida humana, que assinalam o final da Idade Média e boa parte da Idade Moderna. Apesar destas transformações serem bem evidentes na cultura, sociedade, economia, política e religião, caracterizando a transição do feudalismo para o capitalismo e significando uma ruptura com as estruturas medievais, o termo é mais comumente empregado para descrever seus efeitos nas artes, na filosofia e nas ciências.

Chamou-se "Renascimento" em virtude da redescoberta e revalorização das referências culturais da antiguidade clássica, que nortearam as mudanças deste período em direção a um ideal humanista e naturalista. O termo foi registrado pela primeira vez por Giorgio Vasari já no século XVI, mas a noção de Renascimento como hoje o entendemos surgiu a partir da publicação do livro de Jacob Burckhardt A cultura do Renascimento na Itália (1867), onde ele definia o período como uma época de "descoberta do mundo e do homem".

O Renascimento cultural manifestou-se primeiro na região italiana da Toscana, tendo como principais centros as cidades de Florença e Siena, de onde se difundiu para o resto da península Itálica e depois para praticamente todos os países da Europa Ocidental, impulsionado pelo desenvolvimento da imprensa por Johannes Gutenberg. 

A Itália permaneceu sempre como o local onde o movimento apresentou maior expressão, porém manifestações renascentistas de grande importância também ocorreram na Inglaterra, Alemanha, Países Baixos, Portugal e Espanha. Alguns críticos, porém, consideram, por várias razões, que o termo "Renascimento" deve ficar circunscrito à cultura italiana desse período, e que a difusão europeia dos ideais clássicos italianos pertence com mais propriedade à esfera do maneirismo. Além disso, estudos realizados nas últimas décadas têm revisado uma quantidade de opiniões historicamente consagradas a respeito deste período, considerando-as insubstanciais ou estereotipadas, e vendo o Renascimento como uma fase muito mais complexa, contraditória e imprevisível do que se supôs ao longo de gerações.

Costuma-se dividir o Renascimento em três grandes fases, Trecento, Quattrocento e Cinquecento, correspondentes aos séculos XIV, XV e XVI, com um breve interlúdio entre as duas últimas chamado de Alta Renascença.

Causas

* A descoberta do Novo Mundo (Américas): As Grandes Navegações trouxeram novas experiências culturais e científicas. 

* O humanismo: Durante toda a Idade Média, o homem foi uma criatura frágil e submissa à vontade de Deus. Com o humanismo, ele acaba por se tornar responsável por si mesmo e não mais subordinado à vontade divina. 

* A queda de Constantinopla: a importante capital do Império Romano do Oriente, grande centro comercial e cultural medieval. Muitos intelectuais de Constantinopla se dirigiram à Itália após a sua queda. 

* O apoio dos mecenas: ricos senhores que patrocinavam artistas e literatos. 

* A invenção da imprensa: Os livros não seriam mais manuscritos, o que facilitaria a divulgação da cultura. 

* Abertura das universidades: Os humanistas fizeram reviver e renascer valores da Antiguidade clássica greco-romana. 

* Características: O Renascimento tem como características a criação, originalidade, novos ideais, renovação artística e intelectual. 

* Retorno à cultura greco-romana: Antigos valores são reaproveitados. 

* Racionalismo: O uso da razão, mais do que dos sentimentos. 

* Hedonismo: Os prazeres de viver a vida no dia-a-dia foram valorizados. 

* Neoplatonismo: Alguns valores da Igreja foram criticados e abandonados.

Renascimento Literário

O papa Nicolau (1447-1455) reuniu no seu palácio mais de 5 mil manuscritos, que mais tarde viriam a formar a biblioteca do Vaticano, hoje uma das mais ricas do mundo. 

A invenção da imprensa, em 1450, pelo alemão Johannes Gutenberg, foi responsável pela impressão da Bíblia e, daí por diante, surgiram muitos livros, facilitando o contato dos leitores com a cultura. Nesse meio tempo, os artistas italianos se entusiasmaram pela arte greco-romana e tentaram fazê-la reviver. 

Dante Alighieri (1265-1321), escritor italiano. Participou da vida política da cidade de Florença, mas por motivos políticos foi exilado. Escreveu Divina comédia, que já foi traduzida em 50 idiomas. É uma das maiores obras da literatura universal. Na Divina comédia, Dante Alighieri descreve uma viagem ao além, narrando o inferno, o paraíso e opurgatório. 

Francesco Petrarca (1304-1374), italiano, considerado o pai do humanismo. Estudou Direito na Universidade de Bolonha. Suas principais obras são Canzonieri, coletânea de poesias líricas, Epístolas (escritas em latim), A vida solitária e outras. 

Nicolau Maquiavel (1469-1527), escritor e político italiano. Sua grande obra é O Príncipe; nela ele expõe sua doutrina política, conhecida pelo nome de maquiavelismo. Para ele, a arte de governar está na astúcia e na força; o chefe de Estado deve ser um "senhor absoluto" e utilizar todos os recursos e meios para atingir seus objetivos políticos. 

François Rabelais (1494-1553), autor francês que pretendeu satirizar os costumes educacionais da época. Sua obra-prima, Gargântua e Pantagruel, é uma narrativa baseada em lendas populares francesas e nela Rabelais satiriza os costumes da época. 

Michel Montaigne (1533-1592), escritor francês. Estudou Direito e sua principal obra é Ensaios. Nela, ele comenta e analisa o comportamento, as reações do homem e os problemas do seu tempo, tomando por base suas próprias experiências.  

Thomas Morus (1478-1535), estadista e religioso inglês. Foi político e homem de moral admirável. Sua obra-prima é Utopia. Com essa obra ele ficou conhecido em toda a Europa. É um romance político e social, no qual ele aconselha os homens a seguirem o Estado. O Estado é o bem comum e dele virá proteção e segurança para todos. 

William Shakespeare
William Shakespeare (1564-1616), teatrólogo e poeta inglês, autor de mais de 40 peças, 154 sonetos e 2 poemas. Dentre as peças, destacamos: Romeu e Julieta, O mercador de Veneza, Sonhos de uma noite de verão, Macbeth, Rei Lear. 

Miguel de Cervantes (1547-1616). Autor espanhol, sua obra-prima é Dom Quixote de La Mancha. Ela narra as desventuras de um cavaleiro arruinado, Dom Quixote, representando o sonho e a aventura, e Sancho Pança, seu fiel escudeiro, na sua simplicidade de homem do campo. 

Luís de Camões (1524-1580), filho de fidalgos. Português, viajou para as Índias, onde ficou muitos anos a serviço do rei de Portugal. Sua grande obra é Os Lusíadas, publicada em 1572, dedicada ao rei Dom Sebastião. Deixou muitos sonetos e poemas líricos, além de algumas peças de teatro. Camões morreu mendigando para sobreviver, pobre e esquecido. 

Erasmo de Roterdão (1466-1536), professor de grego e de Teologia na Universidade de Oxford. O pensamento de Erasmo se caracteriza por um enorme desprezo pelas lutas de religião. Sua principal obra é Elogio da loucura. Nessa obra ele satiriza a Igreja e a sociedade de sua época. É considerado o pai do humanismo moderno. 

Renascimento artístico

Brunelleschi (1377-1446), escultor e arquiteto italiano. Além de erguer a Catedral de Milão, trabalhou também na Igreja de São Lourenço, no Palácio Pitti e na cúpula daCatedral de São Pedro, no Vaticano. 

Leonardo da Vinci
Leonardo da Vinci (1452-1519), italiano. Foi um famoso pintor, escultor, arquiteto, matemático, cientista, músico e inventor. Famosos são seus estudos sobre plantas, pássaros e anatomia do corpo humano, mesmo porque a Bíblia ensina que o homem foi criado à semelhança de Deus; por isso, para ele, as proporções humanas serviriam de modelo aos artistas. Leonardo foi um gênio e um grande inventor: inventou a tecelagem mecânica, a força motriz do vapor, o paraquedas e técnicas para aviação. Na pintura, introduziu o esfumaçado na coloração. Delicado e gradual, ele partiu do claro ao escuro, da luz à sombra, como podemos observar nos retratos de Gioconda, da rgem das Rocas e da Anunciação. Suas obras mais famosas são Santa Ceia e Gioconda (ou Mona Lisa). 

Ghirlandaio, nascido Domenico de Tomaso Bigordi (1449-1494), pintor italiano, Suas obras mais importantes são a Vida da Virgem, pintada na Capela Tornabuoni da Igreja de Santa Maria Novella, e a Vida de São Francisco, pintada na Igreja da Santa Trindade, ambas em Florença, Itália. 

Michelangelo Buonarroti (1475-1564), pintor, escultor, arquiteto e poeta italiano. Estudou pintura com Ghirlandaio e escultura com Bertoldo. Foi um protegido de Lourenço, o Magnífico. Esteve em sua arte constantemente preso ao pensamento da corrupção do mundo e da redenção do homem, por isso quase todas as suas obras exprimem tormento interior, sofrimento e trabalho. A sua grandeza como pintor se faz presente nesta obra, pintada na Capela Sistina, contando a história do Gênesis e em torno do Juízo Final, obra máxima da arte religiosa no Renascimento. Como escultor, o destaque fica para as suas estátuas Pietá, David e Moisés. Na arquitetura, foi o criador da cúpula da Igreja de São Pedro. Na poesia, deixou um livro denominado Rimas. 


Visão parcial do teto da Capela Sistina
Rafael Sanzio (1483-1520), pintor italiano. Sua arte girou em torno de várias madonas com meninos. Este estilo o acompanhou por toda a sua trajetória artística. Rafael e muitos outros artistas renascentistas tiveram o fundamento religioso nas suas obras. Ele foi autor de várias obras e muitos (a)frescos pintados em vários quartos do Vaticano. 

Tiziano Vercelli (1490-1576), pintor italiano. Em 1516, foi nomeado pintor oficial da corte veneziana e, em 1548, foi nomeado conde palatino por Carlos V. 
Suas obras mais importantes são: Retrato equestre de Carlos V, Adão e Eva, São João Batista no deserto e tantas outras. 

Donatello, nascido Donato di Betto Bardi (1386-1466), escultor italiano, considerado o iniciador do realismo na escultura. Fez inúmeros trabalhos, encontrando-se os mais importantes em Florença, Pádua, Siena. Esculpiu bustos, madonas e cenas do Evangelho. 

O Nascimento de Vênus, de Botticelli
Sandro Botticelli (1444-1510), pintor italiano. Decorou a Capela Sistina, onde pintou as 24 figuras dos profetas, Cristo, atentado pelo demônio, o inferno dantesco. Pintou cenas mitológicas, sendo famosas as obras: O nascimento de Vênus e Alegoria da Primavera. 

Rubens, nascido Peter Paul Rubens (1577; Bélgica), o maior dos pintores flamengos. Demonstra euforia da vida, as formas são livres, as pinturas femininas (as mulheres) são pesadas e as pinturas masculinas (os homens) são sólidas, bem constituídas. Principais telas: Rapto das filhas de Leucipo, Rapto de Europa, Coração de Maria de Médicis e outras. 

Diego Velázquez (1599-1660), grande pintor espanhol. Autor de As meninas, Os bêbados, Esopo e tantos outros trabalhos. 

Miguel Servet (1511-1553), médico espanhol. Dirigiu seus trabalhos em torno da circulação pulmonar. 

Pierre Lescot (1515-1578), arquiteto francês. Foi o construtor da fachada ocidental do pátio do Louvre (Paris). 

Albert Dürer (1471-1528), pintor alemão, autor de Adoração dos magos. 

Renascimento científico

Astrônomo Copérnico:
Conversa com Deus, por Jan Matejko
Nicolau Copérnico (1473-1543), polonês. Seu trabalho girou em torno da revolução da órbita celeste. Ele contestava que a Terra fosse o centro do Universo e dava a ideia da teoria heliocêntrica. Segundo Copérnico, o mundo material não possuía centro. Dessa forma, ele mostrou aos homens que as mesmas leis que regiam os fenômenos da Terra podiam ser aplicadas ao Universo. Copérnico colocou o Sol, e não a Terra, como centro do Universo. Essa teoria se chamou heliocentrismo. 

Isaac Newton (1642-1727), matemático e físico inglês. Descobriu as leis da gravitação universal. O número de pesquisas e descobertas de Newton é muito grande. Aperfeiçoou estudos sobre matemática. Esboçou ideias da ciência natural, ao definir os conceitos de massa, causa, força, inércia, espaço, tempo e movimento. Descobriu as leis que regem o fenômeno das marés, aperfeiçoou a fabricação de lentes e espelhos. Trabalhou na decomposição da luz, criando o disco de Newton. 

William Harvey (1578-1657), médico inglês. Ficou famoso pelos trabalhos de circulação sanguínea. 

Galileu Galilei (1564-1642), italiano. Foi um grande pesquisador nas áreas de matemática, física, astronomia. Para ele, os corpos celestes deviam ser estudados e a Via-Láctea não dependia do nosso Sistema Solar. Estudou a aceleração nas quedas dos corpos e anunciou o princípio da inércia. Foi perseguido pela Igreja porque suas teorias não estavam de acordo com o pensamento vigente.

Ambroise Paré (1509-1590), francês. Fez notáveis trabalhos na medicina, em torno da cirurgia, e eles se tornaram importantes nos progressos médicos. Seus grandes trabalhos foram em torno de fazer estancar hemorragias e ligação de artérias. 

René Descartes (1595-1650), francês, filósofo, matemático, físico e astrônomo. Estudou com os jesuítas e saiu da França, ingressando como voluntário no exército de Maurício de Nassau. Como filósofo, Descartes é chamado o pai do racionalismo. Criou a geometria analítica e fez descobertas na física, escrevendo o tratado sobre a luz. No campo da filosofia, escreveu vários livros, como Discurso do método, Meditações metafísicas. 

Andreas Vesalius (1514-1564), médico belga, nascido em Bruxelas. É considerado, dentro da medicina, o pai da anatomia moderna. 

Johannes Kepler (1571-1630), astrônomo e cientista alemão. Estudou as leis dos movimentos dos planetas e conseguiu apresentar teorias sobre o planeta Marte. Suas leis são famosas dentro da física. 

Conclusão 

O Renascimento foi um fenômeno histórico que fez reviver valores, criar outros novos e trouxe o despertar de novos momentos na literatura, na arte e na ciência. A sociedade da época aproveitou muito da cultura renascentista, que até hoje chega para nós. Foi o Renascimento, sem dúvida, o alvorecer da Idade Moderna.

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Inquisição Espanhola

Escudo da Inquisição espanhola 
(1571). 
Ladeando a cruz, a espada, 
símbolo do castigo aos hereges 
e o ramo de oliveira, 
símbolo da reconciliação 
com os arrependidos.
A Inquisição espanhola ou Tribunal do Santo Ofício da Inquisição foi uma instituição fundada em 1478 por Fernando II de Aragão e Isabel de Castela para manter a ortodoxia Católica em seus reinos que atuou de 1478 até 1834. Esta Inquisição foi o resultado da Reconquista da Espanha das mãos dos árabes muçulmanos, e da política de conversão de judeus e muçulmanos espanhóis ao catolicismo. A Inquisição foi um importante instrumento na política chamada "limpeza de sangue" contra os descendentes de judeus e de muçulmanos convertidos.

Contexto

No século XV a Espanha não era um estado unificado, mas sim uma confederação de monarquias, cada qual com seu administrador, como os Reinos de Aragão e Castela, governados por Fernando e Isabel, respectivamente. No Reino de Aragão (na verdade, uma confederação de Aragão, Ilhas Baleares, Catalunha e Valencia) havia uma Inquisição local desde a Idade Média, tal como em outros países da Europa, porém ainda não havia Inquisição no Reino de Castela e Leão.

A maior parte da Península Ibérica estava sob o governo dos mouros, e as regiões do sul, particularmente Granada, estavam muito povoadas de muçulmanos. Até 1492, Granada ainda estava sob o controle mouro. As cidades mais importantes, como Sevilha, Valladolid e Barcelona (capital do Reino de Aragão), tinham grandes populações de judeus em guetos.

Havia uma longa tradição de trabalhos de judeus no Reino de Aragão. O pai de Fernando, João II de Aragão, indicou Abiathar Crescas, um judeu, como astrólogo da corte. Muitos judeus ocupavam postos de importância, tanto religiosos como políticos.

O aragonês Fernando não pensava usar a religião como meio de controlar o seu povo, mas sim desejava as religiões judaica e muçulmana fora de seus domínios, e a Inquisição foi o meio que usou para atingi-lo. Muitos historiadores crêem que a Inquisição foi o método usado por Fernando para enfraquecer os seus opositores principais no reino. Possivelmente havia também uma motivação econômica: muitos financistas judeus forneceram o dinheiro que Fernando usou para casar com a rainha de Castela, e vários desses débitos seriam extintos se o financiador fosse condenado. O inquisitor instalado na Catedral de Saragoça por Fernando foi assassinado por cristãos novos.

O papa não desejava a Inquisição instalada na Espanha, porém Fernando insistiu. Ele persuadiu a Rodrigo Borgia, então bispo de Valencia, a usar de sua influência em Roma, junto ao papa Sixto IV. Borgia teve êxito, e a Inquisição foi instalada em Castela. Mais tarde, Borgia teve apoio espanhol ao seu papado, ao suceder Sixto IV, com o título de papa Alexandre VI.

Sixto IV era papa quando a Inquisição foi instalada em Sevilha em 1478. Ele foi contra, devido aos abusos, porém foi forçado a concordar quando Fernando ameaçou negar apoio militar à Santa Sé. Fernando obteve assim o que desejava: controlar sozinho a Inquisição espanhola.

A Inquisição e a expulsão dos judeus

Em 1481, Fernando e Isabel indicaram Tomás de Torquemada para investigar e punir os conversos — judeus e mouros que diziam ter-se convertido ao catolicismo, mas que, de fato, continuavam a praticar suas antigas religiões em segredo. Alguns judeus disfarçados tornaram-se padres e mesmo bispos. Os detratores chamavam os judeus convertidos de marranos, uma expressão pejorativa, que se crê significar porcos. Entre os anos 1486 e 1492, 25 autos-de-fé ocorreram em Toledo. Um total de 464 autos-de-fé contra judeus ocorreram entre 1481 e 1826. No total, mais de 13 mil conversos foram julgados entre 1480 e 1492.

Modo de atuação

A Inquisição, como uma corte religiosa, era operada por autoridades da Igreja Católica. Porém, se uma pessoa fosse considerada herege, a punição era entregue às autoridades seculares, pois a Igreja "não derramava sangue". A tortura frequentemente era usada como modo de penitência. As punições variavam: da mais comum (quase 80% dos casos), que era a vergonha pública (obrigar o uso do sambenito, uma roupa de penitente, usar máscaras de metal com formas de burro, usar mordaças) até ser queimado em praça pública, quando o crime era mais grave. A morte pelo garrote (estrangulamento) era usada para os arrependidos. Essas punições eram executadas publicamente, durante os chamados autos-de-fé, que aconteciam uma vez por ano na maioria dos casos. Algumas pessoas acusavam outras por vingança ou para obter recompensas da Coroa. A própria Coroa Espanhola beneficiava-se, ao desapropriar os bens dos conversos.

A Inquisição também foi usada contra os primeiros focos do protestantismo, contra a disseminação das idéias de Erasmo de Roterdão, contra o Iluminismo e, no século XVIII, contra o Enciclopedismo. Apesar das ações das outras inquisições européias contra a bruxaria, as bruxas não eram o principal foco da inquisição espanhola. As acusadas de bruxaria eram normalmente qualificadas como loucas. Durante o governo de Napoleão Bonaparte, a Inquisição foi suspensa na Espanha, porém foi reinstalada quando Fernando VII de Espanha subiu ao trono. O professor Cayetano Ripoli, garroteado em Valencia no dia 26 de julho de 1826, foi a última pessoa morta pela Inquisição espanhola, que, em 15 de julho de 1834, foi finalmente abolida.

A Inquisição também foi instalada no México e no Peru, porém foi abolida nesses países quando se tornaram independentes da Espanha.

Pesquisas recentes sobre a Inquisição espanhola

Pesquisas históricas recentes vêm contestando alguns fatos sobre a Inquisição. Em 6 de novembro de 1994, a BBC de Londres transmitiu o documentário The Myth of the Spanish Inquisition. Segundo o programa, que se baseia em anos de pesquisa em arquivos antes fechados, a Inquisição espanhola – tida como a mais cruel e violenta – teve, na verdade, sua imagem distorcida por protestantes que queriam minar o poder da maior potência mundial na época: a Espanha. O vídeo explica que cada processo inquisitorial ocorrido foi registrado individualmente durante os 350 anos em que a Inquisição esteve ativa, mas somente agora esses registros estão sendo reunidos e analisados adequadamente. No programa, o professor Henry Kamen, especialista no assunto, admitiu que esses registros são extremamente detalhados e vêm trazendo à tona uma visão da Inquisição espanhola que é muito diferente da que estava cristalizada na mente dos historiadores (ele incluso). Henry Kamen lançou, em 1999, o livro The Spanish Inquisition: A Historical Revision. (Yale University Press), que é uma revisão de seu trabalho de 1966 à luz das novas descobertas. A Igreja Católica também auxilia nas pesquisas, liberando todos os documentos que antes eram guardados em universidades católicas para aprofundamentos e estudos mais minuciosos sobre a Inquisição Espanhol.

domingo, 28 de abril de 2013

Tráfico de Escravos no Atlântico

Embora os escravos houvessem sido sempre um produto de exportação da África, não haviam muito mercado para eles na Europa. A terra já tinha servos em número suficiente, e era muito mais fácil contratar empregados domésticos do campesinato local do que importá-los de outro continente. Por fim, os portugueses descobriram que podiam ganhar dinheiro levando grande número de escravos para trabalhar nas plantações de cana-de-açúcar das ilhas tropicais da Madeira e de Cabo Verde, recentemente descobertas no Oceano Atlântico.

A descoberta da América empurrou a escravidão para o centro da economia europeia. Com os nativos americanos morrendo de devastadoras novas doenças, contra as quais eles não tinham uma imunidade inata, o Novo Mundo se defrontava com uma séria escassez de mão de obra. Todo um hemisfério de terras jazia inútil porque não havia ninguém para trabalhar nele. Depois que algumas fazendas experimentais no Caribe mostraram que plantar cana-de-açúcar com escravos africanos dava lucro, a Coroa Espanhola abriu o Novo Mundo para os comerciantes portugueses de escravos em 1513.

Captura

Os europeus não capturavam os escravos, eles mesmos. Doenças tropicais mortais e reis nativos hostis desencorajavam os europeus a penetrar muito fundo no continente africano. Durante a maior parte da época escravagista, a única presença europeia permanente na África ocidental foi uma dezena, mais ou menos, de fortalezas costeiras construídas para evitar que os europeus rivais perfurassem o tráfico, e não para conquistar os nativos. 

Por mais de um século, a escravização de africanos ficou sendo uma atividade puramente portuguesa, mas na década de 1630 os navios de guerra holandeses desafiaram e derrotaram completamente os portugueses por todo o globo. Isso quebrou o monopólio português, e o restante da Europa aproveitou a oportunidade e estabeleceu postos de comércio escravagista por toda a costa africana. 

Os reinos nativos, como os dos ashantes, oyos e congos transformaram-se em lucrativos intermediários do tráfico de escravos, e esses reis ficaram ricos e suntuosos graças aos tributos, impostos e extorsões que mantinham o tráfico fluindo. Em troca de escravos, a África recebia as mercadorias usuais de comércio: enfeites de cobre e latão, têxteis, panelas, chaleiras, facas e conchas de moluscos que serviam como moedas, além de alguns artigos mais interessantes, como arma de fogo e rum. Em logo prazo, mais importante foi a África receber o milho, que se tornou um alimento básico por todo o continente, até mesmo em regiões bem afastadas do litoral.

A princípio, os africanos locais vendiam os escravos que tivessem à mão. A maioria deles era formada por criminosos, adúlteros e devedores, mas, conforme cresceu a demanda, os reinos do litoral africano iniciaram novas guerras, especificamente para capturar prisioneiros a fim de vendê-los como escravos. No final, os comerciantes de escravos nativos faziam incursões terra adentro para sequestrar mão de obra fresca. Depois de capturar uma aldeia, eles geralmente matavam ou abandonavam velhos e crianças, porque não havia mercado para eles. O restante dos habitantes eram levados para serem vendidos. E quando a venda era terminada, os escravos eram marcados com ferro em brasa, com o sinal do proprietário. Depois eles eram comboiados nus para os navios, porque as roupas só faziam aumentar a sujeira na viagem para o Novo Mundo.

Como nas Américas, os escravos geralmente eram postos a trabalhar nos campos, dava-se maior valor a indivíduos grandes e fortes. Cerca de 90% dos escravos embarcados para o Novo Mundo eram adultos ou adolescentes, e os homens constituíam um efetivo que era o dobro do das mulheres. Elas geralmente tinham um preço bastante alto na própria África, o que não permitia que fossem vendidas no exterior.

A Viagem

Em geral de duas a quatro centenas de escravos eram transportadas em cada navio. Eram acorrentados debaixo do tombadilho em pares, tornozelo com tornozelo, pulso com pulso, deitados lado a lado, com cerca de metade do espaço destinado a condenados ou soldados que viajavam na mesma época. Havia baldes dispostos no canto, à guisa de privadas, mas um escravo tinha de chegar lá acorrentado a seu vizinho. Muitos não alcançavam o balde a tempo, e os navios negreiros sempre fediam a dejetos humanos.

Homens e mulheres eram acorrentados em partes diferentes da embarcação, tanto por medida disciplinar como por motivos morais. Num clássico exemplo da dissonância de valores, os capitães dos navios aceitavam bem a escravidão, mas ficavam horrorizados com a possibilidade de atividades sexuais a bordo. Também suspeitavam que os escravos homens ficavam menos dóceis e mais protetores quando havia mulheres entre eles.

Uma viagem geralmente durava de dois a três meses. Os escravos não sofriam muitos maus-tratos nos navios. Eram mantidos razoavelmente sadios, com bastante água e alimentos com amido. Se um escravo tentava fazer uma greve de fome, sua boca era aberta à força e ele, obrigado a comer. Uma vez longe da terra e além da tentação, os escravos eram levados para o tombadilho superior em grupos pequenos, fáceis de controlar, para esticarem os músculos e dançar. Eram geralmente libertados dos grilhões conforme a viagem progredia.

Ao todo, 40% de todos os escravos, isto é, 4,65 milhões, foram transportados pelos portugueses, e 35%, ou 4 milhões, foram enviados para a colônia portuguesa do Brasil. O comércio escravagista atingiu o pico no século XVIII, quando quase 6 milhões de escravos foram trasportados por todas as nações. Durante a década de 1780, uma média de 80 mil novos escravos chegavam às Américas todo ano. Por essa época, os ingleses dominavam o tráfico. A economia escravagista e da cana-de-açúcar era tão lucrativa que todo país europeu com uma boa marinha tentou abocanhar um pedaço dela, mesmo aqueles que nós normalmente não pensamos como transportadores desalmados de escravos, tais como os dinamarqueses. 

No total, cerca de 10 a 12 milhões de escravos foram transportados através do Atlântico. Provavelmente 10% a 15% deles morreram em trânsito, frequentemente de disenteria, escorbuto (falta de vitamina C) e varíola. Os mortos eram atirados por cima da amurada, sem cerimônia, e tubarões seguiam os navios esperando uma refeição fácil.

Entrega

Testemunhas diziam que sempre se podia sentir o cheiro de um navio de escravos entrando num porto. Depois de semanas no mar, as embarcações fediam a urina azeda, suor, vômito e fezes provenientes de trezentos humanos confinados, e as cálidas brisas do Caribe espalhavam o fedor por toda a cidade. Esses barcos geralmente chegavam com um grande cerimonial, salvas de canhão e toques especiais de sinos, para atrair compradores e alertar as autoridade. 

Depois de serem inspecionados por um médico para verificar se não eram portadores de doenças infecciosas, os escravos eram enviados a armazéns ou cadeias de escravos, a fim de serem preparados para a venda. Os novos escravos recebiam comida farta, eram lavados e cobertos de óleo, para ficar mais atraentes do que os miseráveis esqueletos que saíam cambaleando do navio. Eram mostrados, inspecionados e leiloados. Quando a venda era fechada, os escravos eram frequentemente marcados com o ferro em brasa do novo proprietário.

Durante o primeiro ano na fazenda, os africanos eram domados, treinados e aclimatados. Os novos escravos geralmente recebiam tarefas relativamente fáceis, até que ficassem calejados (ou "temperados"), e então eram mandados para as plantações de cana-de-açúcar, ou seja, para um trabalho realmente duro. Mesmo assim, provavelmente um terço de todos os novos escravos morria durante essa "tempera". Embora os africanos, como uma raça, já estivessem sido previamente expostos a todas as doenças do Velho Mundo, desenvolvendo certa imunidade genética, os escravos, como indivíduos, eram em geral muito vulneráveis. Amontoar centenas de pessoas vindas de todos os lugares da África em uma única fazenda, apinhada de gente, expunha muitos desses novos escravos à varíola, sarampo, malária ou febre amarela, pela primeira vez.

Não era a pura biologia que elevava a proporção de mortes. O cultivo da cana era especialmente brutal para o corpo, desde lidar no campo com as folhas da cana, afiadas como facas, até os caldeirões ferventes da usina. A carga de trabalho era excessiva, a comida, pouca, e os aposentos, cheios demais de gente. Acorrentados, se tentavam fugir, e castigados fisicamente por qualquer inflação, a maioria dos escravos logo exibia profundas cicatrizes nos tornozelos e nas costas. 

Muitas das práticas nativas que haviam permitido aos africanos evitar as doenças em sua terra natal, isto é, o cuidado apropriado com os doentes e seu isolamento, enterro adequado dos mortos, preparação dos alimentos, remoção dos dejetos humanos, limpeza das habitações, sombra, descanso tudo isso era um luxo nas fazendas das Américas. Apenas os mais resistentes aguentavam o choque dos primeiros anos.

O maior consumidor de trabalho escravo era a produção de açúcar, que empregava 55% dos novos escravos chegados da África, mas foram feitas fortunas em outras culturas, tais como a do café, que consumia 18% dos novos escravos, a do algodão, 5% e a do cacau, 3%. É claro, os novos escravos se distribuíam por toda a economia, desde o trabalho em minas, com 9%, até servirem como empregados domésticos, com 9%.

Uma vez aclimatados ao Novo Continente, a taxa e mortalidade diminuía, mas os escravos ainda tinham uma expectativa de vida muitos anos menor do que as pessoas livres vivendo na mesma comunidade.

sábado, 27 de abril de 2013

Tratado de Tordesilhas

O Tratado de Tordesilhas, assinado na povoação castelhana de Tordesilhas em 7 de Junho de 1494, foi um tratado celebrado entre o Reino de Portugal e o recém-formado Reino da Espanha para dividir as terras "descobertas e por descobrir" por ambas as Coroas fora da Europa. Este tratado surgiu na sequência da contestação portuguesa às pretensões da Coroa espanhola resultantes da viagem de Cristóvão Colombo, que um ano e meio antes chegara ao chamado Novo Mundo, reclamando-o oficialmente para Isabel, a Católica.

O tratado definia como linha de demarcação o meridiano 370 léguas a oeste da ilha de Santo Antão no arquipélago de Cabo Verde. Esta linha estava situada a meio-caminho entre estas ilhas (então portuguesas) e as ilhas das Caraíbas descobertas por Colombo, no tratado referidas como "Cipango" e Antília. Os territórios a leste deste meridiano pertenceriam a Portugal e os territórios a oeste, à Espanha. O tratado foi ratificado pela Espanha a 2 de Julho e por Portugal a 5 de Setembro de 1494.

Algumas décadas mais tarde, na sequência da chamada "questão das Molucas", o outro lado da Terra seria dividido, assumindo como linha de demarcação, a leste, o antimeridiano correspondente ao meridiano de Tordesilhas, pelo Tratado de Saragoça, a 22 de Abril de 1529.

No contexto das Relações Internacionais, a sua assinatura ocorreu num momento de transição entre a hegemonia do Papado, poder até então universalista, e a afirmação do poder singular e secular dos monarcas nacionais - uma das muitas facetas da transição da Idade Média para a Idade Moderna.

Para as negociações do Tratado e a sua assinatura, D. João II de Portugal designou como embaixador a sua prima de Castela (filha de uma infanta portuguesa) a D. Rui de Sousa. Os originais de ambos os tratados estão conservados no Arquivo General de Indias na Espanha e no Arquivo Nacional da Torre do Tombo em Portugal.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Reforma Protestante

Igreja de Wittenberg
A Reforma Protestante foi um movimento reformista cristão culminado no início do século XVI por Martinho Lutero, quando através da publicação de suas 95 teses, em 31 de outubro de 1517 na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, protestou contra diversos pontos da doutrina da Igreja Católica Romana, propondo uma reforma no catolicismo romano. Os princípios fundamentais da Reforma Protestante são conhecidos como os Cinco solas.

Lutero foi apoiado por vários religiosos e governantes europeus provocando uma revolução religiosa, iniciada na Alemanha, estendendo-se pela Suíça, França, Países Baixos, Reino Unido, Escandinávia e algumas partes do Leste europeu, principalmente os Países Bálticos e a Hungria. A resposta da Igreja Católica Romana foi o movimento conhecido como Contra-Reforma ou Reforma Católica, iniciada no Concílio de Trento.

O resultado da Reforma Protestante foi a divisão da chamada Igreja do Ocidente entre os católicos romanos e os reformados ou protestantes, originando o Protestantismo e o início de massacres e perseguições por parte da Igreja Católica Romana como por exemplo a noite de Massacre da noite de São Bartolomeu.

Pré-Reforma

Martinho Lutero
A Pré-Reforma foi o período anterior à Reforma Protestante no qual se iniciaram as bases ideológicas que posteriormente resultaram na reforma iniciada por Martinho Lutero.

A Pré-Reforma tem suas origens em uma denominação cristã do século XII conhecida como Valdenses, que era formada pelos seguidores de Pedro Valdo, um comerciante de Lyon que se converteu ao Cristianismo por volta de 1174. Ele decidiu encomendar uma tradução da Bíblia para a linguagem popular e começou a pregá-la ao povo sem ser sacerdote. Ao mesmo tempo, renunciou à sua atividade e aos bens, que repartiu entre os pobres. Desde o início, os valdenses afirmavam o direito de cada fiel de ter a Bíblia em sua própria língua, considerando ser a fonte de toda autoridade eclesiástica. Eles reuniam-se em casas de famílias ou mesmo em grutas, clandestinamente, devido à perseguição da Igreja Católica Romana, já que negavam a supremacia de Roma e rejeitavam o culto às imagens, que consideravam como sendo idolatria.

No seguimento do colapso de instituições monásticas e da escolástica nos finais da Idade Média na Europa, acentuado pelo Cativeiro Babilônico da igreja no papado de Avinhão, o Grande Cisma e o fracasso da conciliação, se viu no século XVI o fermentar de um enorme debate sobre a reforma da religião e dos posteriores valores religiosos fundamentais.

No século XIV, o inglês John Wycliffe, considerado como precursor da Reforma Protestante, levantou diversas questões sobre controvérsias que envolviam o Cristianismo, mais precisamente a Igreja Católica Romana. Entre outras idéias, Wycliffe queria o retorno da Igreja à primitiva pobreza dos tempos dos evangelistas, algo que, na sua visão, era incompatível com o poder político do papa e dos cardeais, e que o poder da Igreja devia ser limitado às questões espirituais, sendo o poder político exercido pelo Estado, representado pelo rei. Contrário à rígida hierarquia eclesiástica, Wycliffe defendia a pobreza dos padres e os organizou em grupos. Estes padres foram conhecidos como "lolardos". Mais tarde, surgiu outra figura importante deste período: Jan Huss. Este pensador tcheco iniciou um movimento religioso baseado nas ideias de John Wycliffe. Seus seguidores ficaram conhecidos como Hussitas.

Razões políticas na Reforma

A Reforma protestante foi iniciada por Martinho Lutero, embora tenha sido motivada primeiramente por razões religiosas, também foi impulsionada por razões políticas e sociais os conflitos políticos entre autoridades da Igreja Romana e governantes das monarquias europeias, tais governantes desejavam para si o poder espiritual e ideológico da Igreja e do Papa, muitas vezes para assegurar o direito divino dos reis.

Práticas como a usura eram condenadas pela ética católica romana, assim a burguesia capitalista que desejava altos lucros econômicos sentiria-se mais "confortável" se pudesse seguir uma nova ética religiosa, adequada ao espírito capitalista, necessidade que foi atendida pela ética protestante e conceito de Lutero de que a fé sem as obras justifica (Sola fide).

Algumas causas econômicas para a aceitação da Reforma foram o desejo da nobreza e dos príncipes de se apossar das riquezas da igreja romana e de ver-se livre da tributação papal que, apesar de defender a simplicidade, era a instituição mais rica do mundo. Também na Alemanha, a pequena nobreza estava ameaçada de extinção em vista do colapso da economia senhorial. Muitos desses pequenos nobres desejavam as terras da igreja. Somente com a Reforma, estas classes puderam expropriar as terras.

Durante a Reforma na Alemanha, autoridades de várias regiões do Sacro Império Romano-Germânico pressionadas pela população e pelos luteranos, expulsavam e mesmo assassinavam sacerdotes católicos das igrejas, substituindo-os por religiosos com formação luterana.

Reforma

95 Teses de Lutero
No início do século XVI, o monge alemão Martinho Lutero, abraçando as idéias dos pré-reformadores, proferiu três sermões contra as indulgências em 1516 e 1517. Em 31 de outubro de 1517 foram pregadas as 95 Teses na porta da Catedral de Wittenberg, com um convite aberto ao debate sobre elas. Esse fato é considerado como o início da Reforma Protestante.

Essas teses condenavam a "avareza e o paganismo" na Igreja, e pediam um debate teológico sobre o que as indulgências significavam. As 95 Teses foram logo traduzidas para o alemão e amplamente copiadas e impressas. Após um mês se haviam espalhado por toda a Europa.

Após diversos acontecimentos, em junho de 1518 foi aberto um processo por parte da Igreja Romana contra Lutero, a partir da publicação das suas 95 Teses. Alegava-se, com o exame do processo, que ele incorria em heresia. Depois disso, em agosto de 1518, o processo foi alterado para heresia notória. Finalmente, em junho de 1520 reapareceu a ameaça no escrito "Exsurge Domini" e, em janeiro de 1521, a bula "Decet Romanum Pontificem" excomungou Lutero. Devido a esses acontecimentos, Lutero foi exilado no Castelo de Wartburg, em Eisenach, onde permaneceu por cerca de um ano. Durante esse período de retiro forçado, Lutero trabalhou na sua tradução da Bíblia para o alemão, da qual foi impresso o Novo Testamento, em setembro de 1522.

Enquanto isso, em meio ao clero saxônio, aconteceram renúncias ao voto de castidade, ao mesmo tempo em que outros tantos atacavam os votos monásticos. Entre outras coisas, muitos realizaram a troca das formas de adoração e terminaram com as missas, assim como a eliminação das imagens nas igrejas e a ab-rogação do celibato. Ao mesmo tempo em que Lutero escrevia "a todos os cristãos para que se resguardem da insurreição e rebelião". 

Seu casamento com a ex-freira cisterciense Catarina von Bora incentivou o casamento de outros padres e freiras que haviam adotado a Reforma. Com estes e outros atos consumou-se o rompimento definitivo com a Igreja Romana. Em janeiro de 1521 foi realizada a Dieta de Worms, que teve um papel importante na Reforma, pois nela Lutero foi convocado para desmentir as suas teses, no entanto ele defendeu-as e pediu a reforma. Autoridades de várias regiões do Sacro Império Romano-Germânico pressionadas pela população e pelos luteranos, expulsavam e mesmo assassinavam sacerdotes católicos das igrejas, substituindo-os por religiosos com formação luterana.

Guerras

Lutero era radicalmente contra a revolta camponesa iniciada em 1524 pelos anabatistas liderados por Thomas Münzer, que provocou a Guerra dos Camponeses. Münzer comandou massas camponesas contra a nobreza imperial, pois propunha uma sociedade sem diferenças entre ricos e pobres e sem propriedade privada, Lutero por sua vez defendia que a existência de "senhores e servos" era vontade divina, motivo pelo qual eles romperam. Lutero escreveu posteriormente: "Contras as hordas de camponeses (...), quem puder que bata, mate ou fira, secreta ou abertamente, relembrando que não há nada mais peçonhento, prejudicial e demoníaco que um rebelde".

Em 1530 foi apresentada na Dieta imperial convocada pelo Imperador Carlos V, realizada em abril desse ano, a Confissão de Augsburgo, escrita por Felipe Melanchton com o apoio da Liga de Esmalcalda. Os representantes católicos na Dieta resolveram preparar uma refutação ao documento luterano em agosto, a Confutatio Pontificia (Confutação), que foi lida na Dieta. O Imperador exigiu que os luteranos admitissem que sua Confissão havia sido refutada. A reação luterana surgiu na forma da Apologia da Confissão de Augsburgo, que estava pronta para ser apresentada em setembro do mesmo ano, mas foi rejeitada pelo Imperador. A Apologia foi publicada por Felipe Melanchton no fim de maio de 1531, tornando-se confissão de fé oficial quando foi assinada, juntamente com a Confissão de Augsburgo, em Esmalcalda, em 1537.

Reforma Radical

Ao mesmo tempo em que ocorria uma reforma em um sentido determinado, alguns grupos protestantes realizaram a chamada Reforma Radical. Queriam uma reforma mais profunda. Foram parte importante dessa reforma radical os Anabatistas, cujas principais características eram a defesa da total separação entre igreja e estado e o "novo batismo" (que em grego é anabaptizo).

Calvinismo

Enquanto na Alemanha a reforma era liderada por Lutero, Na França e na Suíça a Reforma teve como líderes João Calvino e Ulrico Zuínglio.

João Calvino
João Calvino foi inicialmente um humanista. Foi integrante do clero, todavia não chegou a ser ordenado sacerdote romano. Depois do seu afastamento da Igreja romana, este intelectual começou a ser visto como um representante importante do movimento protestante. Vítima das perseguições aos huguenotes na França, fugiu para Genebra em 1533  onde faleceu em 1564. Genebra tornou-se um centro do protestantismo europeu e João Calvino permanece desde então como uma figura central da história da cidade e da Suíça. 

Calvino desenvolveu a teoria da predestinação: Deus escolhe os eleitos segundo seu critério, para nós desconhecido, mas justo e infalível, ou seja, o homem nasce salvo ou não, e ocupar um alto posto ou enriquecer pelo trabalho eram sinais da escolha divina. Para a cidade de Genebra, com um comércio desenvolvido e uma poderosa burguesia, essa doutrina significava o reconhecimento da riqueza e do trabalho dos negociantes como situação abençoada aos olhos de Deus. 

Enquanto que o luteranismo era o catolicismo depois que os auditores o haviam limpado, simplificado e adaptado às necessidades locais, o calvinismo era o luteranismo enquadrado: austero, populista e descentralizado. Chamados de huguenotes na França e de puritanos na Inglaterra, os calvinistas acreditavam na absoluta pecaminosidade do homem, que só podia ser redimido pela graça de Deus. Denunciavam a frivolidade e a corrupção do mundo humano, e encorajava os devotos a viver em estrita e ostensiva santidade, sem concessões.

Anglicanismo

A Inglaterra, sob o reinado de Henrique VIII, conheceu uma nova religião: anglicanismo, que reconhecia o rei como chefe supremo da Igreja e do Estado. O rompimento com o Vaticano deveu-se principalmente a fatores políticos: Henrique VIII desejava a anulação de seu casamento com Catarina de Aragão, irmã do rei espanhol. Catarina havia se tornado estéril, sem ter deixado herdeiros masculinos para garantir a sucessão real. O monarca temia que, com sua morte, a Inglaterra passasse a ser dependente do poderoso império espanhol. A recusa do papa em dar o divórcio provocou a separação das Igrejas Romana e Inglesa, que ficou com as terras do Vaticano na Inglaterra e não pagou mais os dízimos obrigatórios.

Outras Consequências

A partir dela surgiram novas igrejas protestantes: huguenotes (França), reformistas (Países Baixos), presbiterianos (Escócia) e puritanos (Inglaterra). 

Essas igrejas aboliram a obrigatoriedade do latim nos ofícios religiosos, desconsideraram a autoridade papal, adotaram como válidos apenas dois sacramentos: o batismo e a eucaristia, acabaram com o celibato para os sacerdotes e permitiram a livre interpretação da Bíblia, aumentando a participação dos fiéis no culto (reuniões de oração e leitura). Criaram uma religião mais individual, em que os santos e os padres passaram a ser dispensáveis.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Contra-reforma

Pintura ilustra sessão do Concílio de Trento
Contrarreforma, também conhecida por Reforma Católica é o nome dado ao movimento que surgiu no seio da Igreja Católica e que, segundo alguns autores, teria sido uma resposta à Reforma Protestante iniciada com Lutero, a partir de 1517. Em 1545, a Igreja Católica Romana convocou o Concílio de Trento estabelecendo entre outras medidas, a retomada do Tribunal do Santo Ofício (inquisição), a criação do Index Librorum Prohibitorum, com uma relação de livros proibidos pela Igreja e o incentivo à catequese dos povos do Novo Mundo, com a criação de novas ordens religiosas, dentre elas a Companhia de Jesus. Outras medidas incluíram a reafirmação da autoridade papal, a manutenção do celibato eclesiástico, a reforma das ordens religiosas, a edição do catecismo tridentino, reformas e instituições de seminários e universidades, a supressão de abusos envolvendo indulgências e a adoção da Vulgata como tradução oficial da Bíblia.

Concílio de Trento

Uma vez que a Reforma Protestante desconsiderou e combateu diversas doutrinas e dogmas católicos, e provocou as maiores divisões no cristianismo, a Igreja Católica Romana convocou o Concílio de Trento (1545-1563), que resultou no início da Contrarreforma ou Reforma Católica, na qual os Jesuítas tiveram um papel importante. A Inquisição e a censura exercida pela Igreja Romana foram igualmente determinantes para evitar que as ideias reformadoras encontrassem divulgação em Portugal, Espanha ou Itália, países católicos. As igrejas protestantes por sua vez, ao mesmo tempo em que propagavam a bíblia e suas idéias graças a invenção da máquina tipográfica de Johannes Gutenberg, também tornaram proibidos uma série de livros católicos e outros que contrariavam suas doutrinas. Edward Macnall Burns observou que "do câncer maligno da intolerância", "não escaparam católicos nem protestantes".

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Paz de Augsburgo

A Paz de Augsburgo foi um tratado assinado entre Carlos V e as forças da Liga de Esmalcalda em 25 de Setembro de 1555 na cidade de Augsburgo, na atual Alemanha.

O resultado da Paz de Augsburgo foi o estabelecimento da tolerância oficial dos Luteranos no sacro império romano. De acordo com a política, a religião (Católica ou Luterana) do príncipe (eleitor) da região seria aquela a que os súbditos desse príncipe se deveriam converter. Foi concedido um período de transição no qual os súbditos puderam escolher se não preferiam mudar-se com família e haveres para uma região governada por um príncipe da religião de sua escolha (Artigo 24: "No caso de os nossos súbditos, quer pertencentes à velha religião ou à confissão de Augsburgo, pretendam deixar suas casas com suas mulheres e crianças por forma a assentar noutra, eles não serão impedidos quer na venda do seu imobiliário desde que pagas as devidas taxas, nem magoados na sua honra").

Apesar de a Paz de Augsburgo ter sido moderadamente bem sucedida em aliviar a tensão no império e ter aumentado a tolerância, ela deixou coisas importantes por fazer. Nem os Anabaptistas¹ nem os Calvinistas ficaram protegidos sob esta paz: muitos grupos protestantes vivendo sob o domínio de um príncipe Luterano ainda se encontravam em perigo de acusação de heresia. (Artigo 7: "No entanto, todas as religiões que não aquelas duas mencionadas acima não serão incluídas na presente paz, e estão totalmente excluídas dela.") A tolerância não foi oficialmente estendida a Calvinistas antes do Tratado de Vestfália em 1648.

As divisões religiosas criadas pela Paz de Augsburgo deixaram a região politicamente fragmentada até bem depois de outras nações-estados se terem unido (Inglaterra, França, Áustria-Hungria, etc), desta forma enfraquecendo a Alemanha como potência mundial até ao final do século XIX (apenas em 1871).

Alguns historiadores acham que foi por causa deste atraso na unificação que se verificou um extremo nacionalismo alemão nos séculos XIX e XX, o que levou indirectamente à Primeira Guerra Mundial e Segunda Guerra Mundial.

1. O anabatismo é exatamente o tipo de cristianismo que se espera que os camponeses professem. Ela prega a igualdade, a paz, a simplicidade, o compartilhamento e outras ideias que têm apelo para as pessoas na base da pirâmide social. Obviamente as autoridades não podem permitir que conceitos perigosos como esses propaguem. Os anabatistas são raros hoje em dia. Também são conhecidos pelo nome de menonitas, um dos primeiros grupos a se posicionarem contra a escravidão. No mundo todo existe apenas 1 milhão de menonitas, mais ou menos.

terça-feira, 23 de abril de 2013

União Ibérica

União ibérica foi a unidade política que regeu a Península Ibérica a sul do Pirinéus de 1580 a 1640, resultado da união dinástica entre as monarquias de Portugal e de Espanha após a Guerra da Sucessão Portuguesa. Na sequência da crise de sucessão de 1580 em Portugal, uma união dinástica que juntou as duas coroas, bem como as respetivas possessões coloniais, sob o controle da monarquia espanhola durante a chamada dinastia Filipina. O termo união ibérica é uma criação de historiadores modernos.

A unificação da península havia sido desde há séculos um objetivo dos monarcas da região. Sancho III de Navarra e Afonso VII de Leão e Castela ambos tomaram o título de Imperator totius Hispaniae, que significa "Imperador de Toda a Hispânia". A união poderia ter sido alcançada antes se Miguel da Paz (1498-1500), Príncipe de Portugal e das Astúrias, filho do primeiro casamento do rei D. Manuel I com a infanta Isabel de Aragão, tivesse chegado a rei, mas este morreu na infância.

A história de Portugal desde a crise de sucessão iniciada em 1578 até aos primeiros monarcas da dinastia de Bragança foi um período de transição. O Império Português estava no auge no início deste período.

Ao longo do século XVII, a crescente predação às feitorias portuguesas no Oriente por holandeses, ingleses e franceses, e a rápida intrusão no comércio atlântico de escravos, minou o lucrativo monopólio português no comércio oceânico de especiarias e no tráfico de escravos, iniciando um longo declínio. Em menor medida, o desvio de riqueza de Portugal pela monarquia dos Habsburgo para sustentar o lado católico na Guerra dos Trinta Anos, também criou tensões dentro da união, embora Portugal tenha beneficiado do poderio militar espanhol para ajudar a manter o Brasil e impedir o comércio holandês. Estes eventos, e aqueles que ocorreram no final da dinastia de Aviz e no período da união ibérica, levaram Portugal a um estado de dependência das suas colónias, primeiro da Índia e depois o Brasil.

Declínio e Revolta Portuguesa

Desde 1583 no exílio, D. António Prior do Crato empenhou toda a sua vida e fortuna na resistência à união ibérica, procurando o apoio de Isabel I de Inglaterra. O auxílio seria prestado ao longo de vários anos, com várias tentativas de desembarque, como a tentativa de tomar Lisboa da Contra armada inglesa de 1589. Porém, sem efeito. Grande parte da aristocracia aceitara Filipe II como rei, e o povo, com medo e desinteressado, não reagiu. D. António seria obrigado a partir novamente para o exílio. 

A revolta surgiu sessenta anos depois, quando Filipe II de Portugal (Filipe III de Espanha) morreu e foi sucedido por Filipe III (e IV de Espanha), o qual teve uma abordagem diferente sobre as questões portuguesas. O aumento de impostos afetou principalmente os comerciantes portugueses. A nobreza portuguesa começou a perder a sua importância nas cortes espanholas, e os cargos de governação em Portugal foram ocupados pelos espanhóis. Em última análise, Filipe III tentou fazer de Portugal uma província real, e os nobres portugueses perderam todo o poder. 

Vários outros problemas minaram o apoio português à união com a Espanha. Um deles foi a pressão, especialmente a partir do conde-duque de Olivares, para compartilhar o fardo financeiro e militar das guerras de Espanha. Os portugueses estavam pouco inclinados a ajudar, uma vez que a Espanha não conseguira evitar a ocupação holandesa de várias das suas possessões coloniais, isto apesar do facto de tanto portugueses como holandeses estarem nominalmente sob a mesma coroa.

A situação culminou numa revolução feita pela nobreza e alta burguesia em 1 de dezembro de 1640. A revolução, embora previsível, foi despoletada quando o João, 8º duque de Bragança foi convocado para organizar tropas e lutar contra revoltosos catalães na Guerra dos Segadores, em que a Catalunha lutou pela independência face a Castela, com o apoio do reino de França. Este recusou. 

João, 8º duque de 
Bragança, aclamado 
João IV de Portugal 
em 1640
O Cardeal Richelieu, primeiro-ministro de Luís XIII de França, apoiou o Duque e a conspiração portuguesa através de agentes em Lisboa. A trama foi planeada por Antão Vaz de Almada, de Miguel Almeida e João Pinto Ribeiro. Estes, juntamente com vários associados - os "Quarenta Conjurados" ou "conjuradores" - aproveitaram o fato de as tropas castelhanas estarem ocupadas no outro lado da península. Os rebeldes mataram o secretário de Estado Miguel de Vasconcelos "defenestrando-o" do palácio na Praça do Comércio e prenderam a impopular Margarida de Saboia, Duquesa de Mântua, prima do rei, que governava Portugal em seu nome como vice-rainha. O momento foi bem escolhido, uma vez que as tropas de Filipe estavam ocupadas lutando na Guerra dos Trinta Anos, além da mencionada revolução na Catalunha.

O apoio do povo tornou-se evidente quase imediatamente, e logo João, 8º duque de Bragança foi aclamado rei de Portugal em todo o país como João IV de Portugal, iniciando a dinastia de Bragança. A 2 de dezembro de 1640, João já tinha enviado uma carta à Câmara Municipal de Évora como soberano do país.