domingo, 11 de agosto de 2013

Guerra Civil Russa - Part I

A maioria dos livros de história para aqui, e segue aceleradamente pelos anos seguintes da história da Rússia. Por essa época, tudo que afetaria o restante do século XX já acontecera. A Rússia se tornara um país comunista e estava fora da guerra. Na visão maior da história, isso era tudo que interessava. O resto não tinha importância e era deprimente, de modo que vamos direto ao que interessa.

Nem todo mundo estava querendo seguir adiante e aceitar o jogo de poder dos bolcheviques. As outras facções do governo russo fugiram de Petrogrado depois da Revolução de Outubro e começaram a reunir tropas nas províncias. Os países capitalistas do Ocidente não estavam obviamente dispostos a acolher de bo grado na comunidade das nações o primeiro governo comunista da história. As minorias étnicas do Império Russo queriam tirar vantagem do caos, para se apresentar como novas nações. A coisa ia ferver.

* O desenrolar dos acontecimentos da guerra civil pode ser reduzido a uns poucos marcos simples, cada um espaçado de um ano, mais ou menos.

* De novembro de 1917 a novembro de 1918, os alemães dominaram e os bolcheviques ficaram subservientes.

* De novembro de 1918 a novembro de 1919, os alemães já estavam derrotados e os bolcheviques estavam na defensiva contra os anti-bolcheviques.

* De novembro de 1919 a novembro de 1920, os bolcheviques estavam na ofensiva contra os anti-bolcheviques.

* Depois de novembro de 1920, os anti-bolcheviques já haviam sido derrotados e os bolcheviques consolidaram o poder.

O mapa da Guerra Civil Russa é, ao mesmo tempo, simples e complexo. A parte simples é que os comunistas, isto é, os Vermelhos, tinham o controle do centro, e estavam sendo atacados de todos os lados por forças hostis, geralmente conhecidas como os Brancos. A parte complexa é que, quase de cada uma daquelas direções, eles eram atacados por uma força hostil completamente diferente. Não eram apenas os Brancos, russos propriamente ditos, mas também alemães, poloneses, cossacos, britânicos, americanos e japoneses. 

Um Pequeno Resumo


Aproveitando-se do verdadeiro caos em que o país se encontrava, as nações aliadas da Primeira Guerra Mundial resolveram intervir a favor dos Brancos (tzaristas e liberais). Tropas inglesas, francesas, americanas e japonesas desembarcaram tanto nas regiões ocidentais (Crimeia e Geórgia) como nas orientais (ocupação de Vladivostok e da Sibéria Oriental). Seus objetivos eram: derrubar o governo bolchevique (que era pela paz com a Alemanha) e instaurar um regime favorável à continuação da Rússia na guerra; mas talvez seu objetivo maior fosse evitar a propagação dos ideais comunistas pela Europa Ocidental - daí a expressão utilizada por Georges Clemenceau, primeiro-ministro da França - de "cordon sanitaire".

No terreno econômico, devido à situação de emergência e pelo próprio ímpeto revolucionário, o partido bolchevique instituiu o "comunismo de guerra". O dinheiro e as leis do mercado foram abolidas, sendo substituídos por uma economia dirigida baseada na tributação em gênero sobre cereais produzidos pelos camponeses. Uma das consequências negativas destas medidas foi desencorajarem o plantio, por levarem os camponeses a sentir que bastaria produzir para sustento de suas famílias, o que resultou em os centros urbanos ficarem sem alimentos, provocando um êxodo das cidades para o campo - Petrogrado (atual São Petersburgo) e Moscou viram sua população reduzir-se pela metade. Estes factores terão contribuído, na conjuntura da guerra civil e das intervenções estrangeiras, para a fome de 1921 - uma das maiores mortalidades na Rússia moderna, em que pereceram milhões.

Cossacos (Sudeste)

Quase desde o começo, os cossacos do Don recusaram-se a reconhecer a autoridade dos bolcheviques, e firmaram sua independência pela força das armas em julho de 1918, data essa que é geralmente considerada o início oficial da Guerra Civil Russa. Os vermelhos tentaram impor sua autoridade durante os primeiros meses de 1919, varrendo o território cossaco e sistematicamente executando cerca de 13 mil contra-revolucionários. Um novo levante cossaco contra esse terror ajudou a ofensiva do vizinho Exército Branco, sob o comando do general Anton Denikin.

Alemães (Sudoeste)

A ocupação alemã não atingiu o interior étnico profundo da Rússia, mas os alemães se apoderaram de quase todas as terras europeias habitadas por não russos, que se tornariam repúblicas independentes em 1991. A Alemanha começou a organizar esses territórios como Estados Vassalos, mas o armistício geral, em novembro de 1918, levou a uma apressada retirada. A maior parte dos territórios tentou, então, firmar sua existência independente. Finlândia, Estônia, Letônia, Lituânia e Polônia conseguiram isso. Os ucranianos e os povos das montanhas do Cáucaso não conseguiram.

Brancos (Noroeste)

Depois que a Alemanha se retirou da Rússia, os general Nikolai Yudenich comandou um pequeno exército de Brancos, partindo da Estônia, na direção de Petrogrado, em outubro de 1919. Durante algumas semanas esse deslocamento significou uma ponta de lança mortal apontada para o regime vacilante dos bolcheviques, mas os invasores foram repelidos mais ou menos na mesma época em que as ofensivas dos Brancos em outros lugares entravam em colapso.

Aliados (Norte)

Em julho de 1918, uns poucos milhares de soldados britânicos e americanos começaram a chegar aos portos subárticos de Archangel e Murmansk para guardar os estoques de material de guerra Aliado e evitar que caíssem nas mãos dos alemães ou dos bolcheviques. Conforme a Rússia ficava mais caótica, essa força cresceu em efetivo. Como cada país do Ocidente queria ganhar um assento na eventual conferência de paz, e talvez conseguir valiosas concessões comerciais e colônias dentro da nova Rússia, todos os outros Aliados, australianos, franceses, canadenses, italianos, sérvios e assim por diante, enviaram perímetros defensivos em torno dos portos, os Aliados se viram travando combates esporádicos, mas às claras, com os bolcheviques, embora de maneira relutante. Ninguém esperava seriamente que essas forças Aliadas afetassem o resultado da guerra civil, de modo que quando, depois de alguns anos, ficou claro o caminho que a Rússia estava tomando, os Aliados abandonaram finalmente aqueles portos do norte da Russia.

A batalha contra os bolcheviques matou 304 americanos, mais do que o dobro do número de americanos mortos em combate durante a Guerra do Golfo, em 1991, mas os americanos não gostam de falar desse assunto, provavelmente porque perderam, mas também porque a intervenção pareceu justificar a paranoia russa durante a Guerra Civil. Você nunca vê a Guerra Civil Russa na relação oficial das guerras americanas. 

Brancos (Leste)

Provavelmente a legenda que mais nos confunde em qualquer mapa da Guera Civil Russa é o aparecimento de um exército tcheco sob o comando de um almirante russo no meio da Sibéria, a milhares de quilômetros, tanto de Praga quando dos oceanos navegáveis.

Durante a Primeira Guerra Mundial, os Aliados haviam organizados 60 mil prisioneiros e desertores eslavos do exército austro-húngaro para lutar na frente russa no âmbito da Legião Tcheca, para ajudar a libertar a Boêmia do domínio do Império Austro-Húngaro. Mas, depois de caírem fora da guerra, os bolcheviques não precisavam mais deles e a Legião Tcheca foi enviada para fazer contato com os Aliados em algum outro lugar. O plano dos tchecos era retornar à guerra fazendo um rodeio, pela ferrovia transiberiana, a qual se estendia até o oceano Pacífico e era a única via de transporte que realmente os alemães não bloqueavam.

Numa determinada estação da ferrovia, os soviéticos locais tentaram desarmar os tchecos, mas isso só os tornou mais enraivecidos. Eles inverteram a marcha e foram abrindo caminho pelo interior do país, ao longo da ferrovia. Finalmente transformaram-se na espinha dorsal das forças dos Brancos do Leste.

O almirante nos mapas da Sibéria era Alexandre Kolchak, ex-comandante da frota russa no mar Negro, que se demitira em junho de 1917, antes que os bolcheviques assumissem o poder. Durante algum tempo ele perambulou pelas comunidades de emigrantes russos, e finalmente terminou organizando forças anti-bolcheviques na Manchúria. Deslocou-se então por terra para Omsk onde se tornou ministro da Guerra do governo conservador da Rússia.

Em novembro de 1918, o almirante Kolchak apoderou-se de Omsk por meio de um golpe de Estado. Durante o ano seguinte, ele foi considerado internacionalmente como o governante oficial do Estado; entretanto, depois que sua ofensiva contra os bolcheviques fracassou, em novembro de 1919, ele abandonou Omsk. Em janeiro de 1920, os Brancos retiraram-se para Irkutsk, pela ferrovia transiberiana, onde ficaram encurralados quando o governo mudou de mãos. A Legião Tcheca entregou o almirante às novas autoridades em troca de salvo-conduto para seu país de origem, e os Vermelhos o fuzilaram e jogaram o corpo no rio mais próximo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário